A fertilidade feminina pode ser impactada por diversos fatores – hormonais, genéticos, anatômicos ou fatores ambientais. Entre as causas menos conhecidas, mas extremamente relevantes, está a Síndrome de Asherman, uma condição uterina que pode comprometer severamente a capacidade de uma mulher engravidar.
Apesar de rara, a síndrome exige atenção redobrada, sobretudo de pacientes que já passaram por procedimentos ginecológicos ou que enfrentam dificuldades para engravidar.
A Síndrome de Asherman é caracterizada pela formação de aderências intrauterinas, ou seja, áreas de tecido cicatricial dentro da cavidade uterina. Essas aderências podem variar de finas membranas a cicatrizes espessas, que muitas vezes unem as paredes do útero parcial ou totalmente.
Com isso, a anatomia e a funcionalidade do útero são prejudicadas, dificultando a menstruação, a implantação embrionária e, consequentemente, a gravidez.
A médica ginecologista Dra. Graziele Reis, especialista em reprodução assistida do IVI Salvador, explica. “Essas aderências geralmente surgem como consequência de procedimentos invasivos no útero, como curetagens após abortos ou após partos, cirurgias no útero e infecções graves. Quando a cavidade é danificada, o processo de cicatrização pode sair do controle e formar tecidos fibrosos onde deveria haver um endométrio saudável”.
As causas mais comuns
A causa mais frequente da Síndrome de Asherman é a curetagem do útero, especialmente quando realizada após abortamentos incompletos, infecções no pós-parto ou em situações de retenção da placenta.
Outros fatores de risco incluem também as Miomectomias (cirurgias para retirada de miomas), as cirurgias para a remoção de pólipos ou septos no útero, cesarianas complicadas ou endometrites (inflamações do endométrio), em especial as causadas por tuberculose genital em países com maior incidência.
Embora a síndrome possa ocorrer em qualquer mulher, os riscos aumentam com o número de procedimentos intrauterinos que já foram realizados.
Sintomas
Muitas mulheres com a Síndrome de Asherman não apresentam sintomas evidentes. No entanto, há sinais que podem representar alerta importantes.
Entre eles, a amenorreia (ausência de menstruação) ou hipomenorreia (menstruação fraca). Cólicas intensas sem sangramento (quando o fluxo menstrual está preso pelas aderências), também podem ser um sinal.
Abortamentos de repetição e infertilidade sem causa aparente estão no rol dos possíveis sintomas do problema.
A Dra. Graziele Reis destaca que “toda paciente que nota alterações na menstruação após um procedimento no útero deve ser cuidadosamente avaliada. A ausência de menstruação não é sinônimo de saúde; pode ser o sinal de que a cavidade está obstruída e precisa de intervenção”, alerta.
Como é realizado o diagnóstico
O diagnóstico da Síndrome de Asherman é desafiador, especialmente em casos leves. Alguns exames podem levantar suspeitas, mas o mais utilizado, normalmente, é a histeroscopia diagnóstica.
Esse exame permite visualizar diretamente a cavidade do útero e identificar a presença, extensão e localização das aderências.
Outros exames que podem auxiliar são a ultrassonografia transvaginal com infusão de soro fisiológico (sono-histerografia), a histerossalpingografia, que também avalia as tubas do útero e a ressonância magnética, em casos específicos.
O tratamento para a Síndrome de Asherman
O tratamento da Síndrome de Asherman é cirúrgico, realizado por histeroscopia operatória. Nesse procedimento, o médico introduz uma microcâmera com instrumentos pela vagina e rompe cuidadosamente as aderências, restaurando a anatomia do útero.
Após a cirurgia, para prevenir a recidiva das aderências, pode ser necessário o uso de dispositivos intrauterinos (DIU) temporários, terapia hormonal com estrogênio para estimular a regeneração do endométrio e antibióticos profiláticos, se houver risco de infecção.
A resposta ao tratamento vai depender muito da extensão das aderências e da integridade do endométrio após a cirurgia. Em casos mais leves, as taxas de recuperação da fertilidade são bastante promissoras.
Síndrome de Asherman e a medicina reprodutiva
Infelizmente, em casos graves da Síndrome de Asherman, mesmo após o tratamento, o endométrio pode não se regenerar de maneira adequada, o que complica a situação de mulheres e casais em busca de ampliar a família.
Nessas situações, a fertilização natural pode se tornar inviável. É aí que entra a Fertilização In Vitro (FIV) como uma excelente alternativa oferecida pela medicina reprodutiva.
Muitas mulheres com Síndrome de Asherman de leve a moderada, conseguem engravidar utilizando a técnica da fertilização in vitro; desde que o endométrio esteja funcional para permitir a implantação do embrião.
Na FIV, os óvulos são coletados e fertilizados em laboratório. Em seguida, o embrião é transferido para o útero. Porém, em mulheres com a Síndrome de Asherman severa, a própria cavidade do útero pode não ser capaz de manter uma gestação.
Nesses casos, considera-se o uso de útero de substituição (barriga solidária), a doação de embriões ou óvulos, dependendo da condição do ovário da paciente.
“Temos visto resultados animadores em pacientes que, após o tratamento adequado das aderências, conseguiram não apenas engravidar, mas levar a gestação até o fim com segurança. A chave está em um diagnóstico precoce e em um tratamento personalizado”, defende a especialista.
Avanços na medicina reprodutiva representam novas esperanças para as mulheres
A medicina reprodutiva tem evoluído significativamente nas últimas décadas e, com isso, surgem novas possibilidades para as mulheres que sofrem com a Síndrome de Asherman. Entre os avanços mais promissores, está o uso de células-tronco e terapias regenerativas para estimular a recuperação do endométrio.
Pesquisas realizadas ainda em caráter experimental, com infusões intrauterinas de células-tronco derivadas da medula óssea, por exemplo, têm mostrado resultados iniciais positivos em mulheres que não responderam ao tratamento convencional.
Essas terapias ainda estão em fase de testes, mas representam uma luz no fim do túnel para os casos mais severos.
Outra inovação é o uso de biomateriais e scaffolds (estruturas biológicas temporárias) que ajudam na regeneração do endométrio após a remoção das aderências. “Estamos vivendo uma era de esperança para essas pacientes, e o futuro aponta para tratamentos cada vez mais eficazes e personalizados”, conta a médica do IVI Salvador.
A Síndrome de Asherman pode ser um desafio silencioso na vida de muitas mulheres que sonham em ser mães. Por isso, o conhecimento e a informação são aliados poderosos. Cada caso deve ser tratado com empatia, uma equipe médica experiente e o acesso às tecnologia de ponta.
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